Mãe denuncia supostos maus-tratos contra filha autista em creche: ‘você vai ficar fechada’, diz funcionária em gravação; OUÇA

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Após ouvir áudios em escola de Pirassununga (SP), ela suspeita que criança era trancada em banheiro. Professora e 2 auxiliares foram afastadas. Polícia, MP e a prefeitura apuram o caso.

A Polícia Civil, o Ministério Público e a Prefeitura de Pirassununga (SP) investigam uma denúncia de supostos maus-tratos contra uma menina autista de 2 anos, na Creche Municipal Nedy de Oliveira. Após gravar áudio na unidade, a mãe suspeita que a criança era trancada no banheiro.

Uma professora e duas auxiliares foram afastadas da sala de aula por suspeita de envolvimento no caso.

Desconfiada de que a filha de 2 anos era maltratada, Ingrid Morais, de 34 anos, escondeu um celular com o comando de gravador de voz ativado na mochila da criança e registrou um áudio de 7 horas na escola. 

Em um trecho, uma profissional não identificada questiona se a criança, que chorava na ocasião, queria ficar ‘fechada’. (Confira abaixo trechos da gravação e a transcrição).

“Quer ficar aí fechada? Se você não parar, você vai ficar aí fechada”, afirmou na gravação uma das profissionais para a criança.

Mãe denuncia supostos maus-tratos contra filha autista em creche de Pirassununga 

Pais da menina esconderam celular com gravador na mochila da criança — Foto: Nilson Porcel/EPTV
Pais da menina esconderam celular com gravador na mochila da criança — Foto: Nilson Porcel/EPTV 

Ingrid registrou um boletim de ocorrência e fez uma denúncia no Ministério Público. Além disso, ela acionou o Conselho Tutelar e também registrou a queixa na Secretaria Municipal de Educação. 

A gravação, que foi feita pela mãe no dia 6 de maio, foi entregue à Polícia Civil. 

“Só quero justiça pelo que aconteceu com a milha filha. Não podem fazer isso com uma criança, minha filha ficou traumatizada”, desabafou a mãe. 

Desconfiança com comportamento

Polícia investiga denúncia de maus-tratos contra menina autista em creche de Pirassununga

Ao g1, Ingrid contou que notou comportamentos estranhos na filha ao dizer que ela teria que ir para a escola ou ao pegar a criança na creche. 

A menina foi diagnosticada com autismo nível três e não fala. “Minha filha não fala, ela não sabe pedir socorro. Ela parou de se alimentar, de sorrir, de brincar. Então foi muito radial. E, na quinta-feira da semana que eu coloquei o gravador, ela chegou da creche extremamente gelada, muito assustada. Aí ela fez uma posição que imitasse como se ela tivesse presa”, disse.

“Sabe aquela coisa de mãe? Eu falei ‘meu Deus, tá acontecendo alguma coisa’, aí eu acalmei minha filha e quando eu fui tentar dar banho nela, ela entrou em choque, acho que porque o banheiro era um lugar traumático. Ali mesmo, na minha própria cabeça eu falei, ‘tão colocando minha filha no banheiro'”, completou. 

Criança apresentou comportamento diferente em casa ao voltar da creche em Pirassununga — Foto: Nilson Porcel/EPTV
Criança apresentou comportamento diferente em casa ao voltar da creche em Pirassununga — Foto: Nilson Porcel/EPTV 

Diante das desconfianças, Ingrid e o marido resolveram colocar um celular com o comando de gravador de voz ativado dentro da mochila da menina. A mulher contou que ficou chocada e revoltada com o que ouviu. 

“Decidimos colocar um gravador, pelo menos a gente vai conseguir ouvir o que está sendo falado. A gente achava que estava tendo maus-tratos, mas de gritarem com ela. Na hora que a gente escuta o áudio é um absurdo, é muito desumano, é coisa que não dá para acreditar que fizeram com uma criança”, desabafou. 

Ingrid procurou as autoridades e o caso mobilizou a cidade de pouco mais de 77 mil habitantes. “Só quero justiça pro que aconteceu”, finalizou.

Ingrid, mãe da criança que teria sido vítima de maus-tratos em Pirassununga, ao lado do marido — Foto: Nilson Porcel/EPTV
Ingrid, mãe da criança que teria sido vítima de maus-tratos em Pirassununga, ao lado do marido — Foto: Nilson Porcel/EPTV 

Veja transcrição de trechos do áudio

g1 ouviu as 7 horas de gravação e separou trechos com falas das profissionais que sugerem maus-tratos contra a criança, que passa a maior parte do tempo chorando.

Em um trecho, uma mulher questiona se a menina tomou banho e faz comentários sobre como a ela está vestida.

Mulher não identificada 1 – “Não tomou banho? Você tomou banho ou não? Tomou banho ou não? Não?
Mulher não identificada 2– [risadas] 
Mulher não identificada 1 – “Poxa vida, hein. Que que aconteceu na sua casa? Não tem água mais?” 
[trecho inaudível]
Mulher não identificada 1 – “Ela responde. Ela [inaudível], hein? Tá com água na sua casa ou não?”
Mulher não identificada 2 – “É sempre assim” 
Mulher não identificada 1 – “Tem água? Tem água na sua casa, mas a sua mãe não quer dar banho em você que tá frio? Nossa, fala pra ela que você vai ficar com a xixi [inaudível]” 
Mulher não identificada 2 – “Sua mãe não dá banho em você, [nome da criança]?” 
Mulher não identificada 1 – “Acho que não.” 
Mulher não identificada 2 – “Mas molhou o cabelinho, né? Porque o cabelinho tá molhado.” 
Mulher não identificada 1 – “A calça é do dia inteiro” 
Mulher não identificada 2 – “Desde ontem?” 
Mulher não identificada 1 – “A sandália veio sem meia igual ontem [inaudível]. 

No mesmo trecho, a criança continua chorando e uma mulher afirma que se ela não parar “vai para o banheiro de novo”.

Mulher não identificada 1 – Ê, [nome da criança], que dureza. É difícil, [nome da criança]? Ah pode parar se não você vai para o banheiro de novo. Vai, eu não aguento. Você vai para o banheiro, de manhãzinha na minha orelha. Quer ir para o banheiro?” 
Mulher não identificada 2 – “Onde você vai sentar? Então senta, pode brincar” 
Mulher não identificada 1 – “Chora baixo também, não quer brincar abaixa a cabeça”

Em outro trecho, não é possível diferenciar a voz de uma mulher que pergunta para a criança se ela ‘quer ficar fechada’ e que, se ela não parar de chorar, ‘vai ficar aí fechada’. A suspeita da mãe é que a criança ficava trancada no banheiro ou em um cercadinho fora da sala.

Mulher não identificada 1 – “Se não você vai lá para o banheiro, que nem ontem” 
Mulher não identificada * – “Quer ficar aí fechada? Se você não parar, você vai ficar aí fechada” 
Criança continua chorando.
Mulher não identificada * – “Se você não parar você vai ficar fechada. Quer ficar fechada?” 
[Barulho que indica uma porta batendo].
Mulher não identificada 1 – “Aí que alívio.” 
Mulher não identificada 2 – “Não adianta, ela não para, você pode morrer”

Em outro trecho, a mulher fala que a criança não é autista, mas sim louca e sabe o que faz. 

Mulher não identificada * – “Ela é inteligente, ela não é autista” 
Mulher não identificada 1 – “Ela é louca” 
Mulher não identificada * – “Não é autista, ela sabe o que faz” 
Mulher não identificada 2 – “Nós vamos brincar lá fora e a [nome da criança] não vai, a [nome da criança] vai ficar aqui na sala” 

Um outro trecho mostra que uma mulher parece tentar assustar a criança se passando por ‘bicho papão’.

Mulher não identificada 2 – “Eu vou pegar a [nome da criança], eu vou comer a [nome da criança], eu vou comer a [nome da criança]” 
[Barulho de socos em armário]
Mulher não identificada 2 – “Eu vou pegar ela, vou pegar ela” 
[Mais barulho de socos em armários]

* não é possível diferenciar a voz da mulher

Polícia Civil, prefeitura e MP apuram o caso

A Prefeitura de Pirassununga informou que o caso está sendo investigado pela Polícia Civil e que instaurou um procedimento administrativo para avaliar o caso. 

Segundo a prefeitura, três profissionais suspeitas de envolvimento no caso, uma professora e duas auxiliares, foram afastadas da sala de aula e fazem serviços internos na Secretaria de Educação, até que a investigação seja concluída. As identidades delas não foram divulgadas.

De acordo com a prefeitura, para que sejam punidas, é necessário que sejam encerradas as investigações policiais e a apuração feita pelo procedimento administrativo instaurado. 

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) disse que o caso é investigado por meio de inquérito policial instaurado no 1º Distrito Policial, que corre sob sigilo. 

O Conselho Tutelar disse que a competência de investigação é da Secretaria de Educação, que prestou todos os atendimentos pertinentes à criança e a família e confirmou que existem outras denúncias de maus-tratos envolvendo a Creche Municipal Nedy de Oliveira

g1 também procurou o Ministério Público que informou o na terça-feira (24) registrou o caso como ‘Notícia de Fato’ e que irá expedir um ofício à Prefeitura de Pirassununga para que seja feita a apuração da conduta das profissionais envolvidas.

Fonte: G1

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