O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, por intermédio da 11ª Promotoria de Justiça de Ipatinga(promotor de justiça Igor Citeli Fajardo Castro), ofereceu denúncia ao Juízo da Vara de Execuções Penais ,Cartas Precatórias Criminais e do Tribunal do Júri da Comarca de Ipatinga, com base no incluso inquérito policial, em desfavor de:
Miguel Alves Nacimento,18 anos, residente, no bairro Nova Esperança, em Ipatinga/MG; (atualmente preso),
Leonardo Victor Citadino da Costa,22 anos, residente, no bairro Nova Esperança, em Ipatinga/MG; (atualmente preso) e Marcelo Augusto Rodrigues, 18 anos, residente no bairro Chácaras Madalena, em Ipatinga; (atualmente preso).
De acordo com a denúncia do MPMG.
O citados foram denunciados em virtude da prática dos seguintes fatos delituosos.
Fato 1 – DUPLO HOMICÍDIO QUALIFICADO CONSUMADO
Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, durante a madrugada do dia 6 de janeiro de 2024 (sábado), nas margens da rua Catuaba, s/n, bairro Chácaras Madalena, em Ipatinga, os denunciados Miguel Alves, Leonardo Victor, Marcelo Augusto e Miguel Leonardo Fernandes de Almeida (falecido), agindo de forma livre, voluntária e consciente, em unidade de desígnios e comunhão de esforços, por motivo torpe, com emprego de meio cruel, mediante recurso que dificultou as defesas das ofendidas, para assegurarem a ocultação e impunidade de outros crimes, com menosprezo à condição de mulher e com emprego de arma de fogo de uso restrito, mataram as vítimas Camila Keila Ribeiro da Cruz e Elisângela Ribeiro da Cruz (34 e 50 anos de idade, respectivamente, na data dos fatos), com disparos de arma de fogo, causando-lhe as lesões, que foram a causa eficiente de suas mortes. Conforme apurado, Camila mantinha um relacionamento extraconjugal com Vinícius da Silva Pereira. Em decorrência de desentendimentos conjugais, Vinícius optou por encerrar as relações com Camila. Inconformada com o término, Camila resolveu se vingar de Vinícius. Para tanto, Camila contratou os autores Miguel Alves, Leonardo Victor, Marcelo Augusto e Miguel Leonardo para baterem em Vinícius. Na oportunidade, ficou combinado que metade do pagamento seria feito à vista, e que a outra metade seria paga com a conclusão do serviço ilicitamente acordado.
Todavia, por circunstâncias alheias à vontade de Camila e dos autores, o plano não foi realizado, não chegando, nem mesmo, a ser iniciado, uma vez que Vinícius não foi encontrado em sua residência.
Diante da não execução do serviço, Camila, acompanhada por sua irmã Elisângela, resolveu ir atrás dos autores para confrontá-los, exigindo o cumprimento do serviço ou a devolução dos valores que haviam sido pagos. Contudo, os autores não aceitaram a cobrança feita pelas vítimas, e tão logo insurgiram-se contra elas.
Na ocasião, os autores cercearam, mediante sequestro, a liberdade das vítimas Camila e Elisângela, mantendo-as em cativeiro privado, com as mãos e pernas amarradas, e suas bocas amordaçadas com sacola e fita isolante. Após torná-las completamente indefesas, os autores praticaram com as vítimas relações sexuais não consentidas (estupro), causando às irmãs, além da constrangedora humilhação, intenso sofrimento físico e psicológico.
Em determinado momento, durante a madrugada de sábado, sob a ameaça de serem mortas, os autores obrigaram as vítimas, ainda amarradas e amordaçadas, a entrarem no veículo utilizado por Camila (HB20 cor prata), para que fossem conduzidas para o local onde seria o palco das execuções.
No local, após desembarcarem as vítimas Camila e Elisângela, os autores determinaram que elas se ajoelhassem para que fossem executadas. Na ocasião, os autores efetuaram 10 (dez) disparos de arma de fogo (calibre .9mm) contra as vítimas, preponderantemente na região da cabeça. Ambas foram alvejadas com 5 disparos, cada.
As investigações concluíram que Camila foi forçada a assistir a morte de sua irmã Elisângela, e, em seguida, foi executada com 5 (cinco) disparos, sendo 4 (quatro) deles na região da face. Um dos disparos foi realizado com a arma encostada na cabeça de Camila, deixando gravado, em decorrência da queimadura na pele, o formato do cano da arma utilizada.Após execução do delito, os autores subtraíram os pertences pessoais das vítimas, e, em seguida, dispensaram as vestes que utilizavam, e se evadiram do local, permanecendo escondidos até que foram capturados e presos.
QUALIFICADORAS
Evidenciou-se que o crime foi praticado por motivo torpe, na medida em que os autores mataram as vítimas por retaliação a um desentendimento por questões financeiras, relacionadas com a não execução de um serviço ilicitamente acordado, e a recusa dos acusados em restituir os valores que haviam sido pagos pela vítima.
O delito foi cometido com emprego de meio cruel, dada a multiplicidade de disparos efetuados pelos autores, somada ao terror provocado nas vítimas, que foram conduzidas sob constantes ameaças de morte para o local onde foram brutalmente assassinadas, fazendo com que experimentassem imensurável sofrimento físico e psicológico antes de suas mortes.
Constatou-se, ainda, que o crime foi praticado mediante recurso que dificultou as defesas das ofendidas, tendo em vista a superioridade numérica e fisiológica dos autores, que suprimiram todos os mecanismos de defesa de Camila e Elisângela. Tanto é que as vítimas foram encontradas amarradas e amordaças, evidenciando a notória desproporção de forças, o que dificultou, sobremaneira, qualquer possibilidade de resistência.
O delito foi ainda praticado para assegurar a ocultação e impunidade dos delitos anteriores, na medida em que os autores deliberaram por matar Camila e Elisângela para ocultar os crimes anteriores de sequestro e estupro, buscando, assim, a impunidade em relação a estes.
O delito foi cometido contra vítimas mulheres, por razões da condição de sexo feminino, consubstanciado no menosprezo à condição de mulher, na medida em que os autores humilharam as vítimas violando-as sexualmente, circunstância que não aconteceria se naquele contexto as vítimas fossem do sexo masculino.
Por fim, tem-se que o crime foi praticado com emprego de arma de fogo de uso restrito, uma vez que a perícia concluiu que as vítimas foram executadas com munições de calibre .9mm, as quais são de uso restrito das forças de segurança pública. Apesar de não ter sido aprendida a arma utilizada no delito, por corolário lógico, tem-se que o armamento apto a deflagrar as munições .9mm é de uso restrito.
SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO QUALIFICADO
Ainda, consta do inquérito policial que, entre os períodos de 23h32min do dia 5 de janeiro de 2024 e 4h20min do dia seguinte (6 de janeiro), os denunciados Miguel Alves, Leonardo Victor e Marcelo Augusto e Miguel Leonardo Fernandes de Almeida (falecido), agindo de forma livre, voluntária e consciente, em unidade de desígnios e comunhão de esforços, privaram as vítimas Camila Keila Ribeiro da Cruz e Elisângela Ribeiro da Cruz de suas liberdades, mediante sequestro e mantendo-as em cárcere privado, resultando, em decorrência dos maus-tratos, em grave sofrimento físico e moral. Conforme apurado, as vítimas Camila e Elisângela deslocaram até o bairro Nova Esperança, em Ipatinga, com a intenção de encontrar os autores para exigir o cumprimento do serviço ilicitamente acordado, ou, a devolução dos valores que haviam sido pagos.
Todavia, nenhuma das exigências foram atendidas pelos autores, que, por sua vez, deliberam por sequestrar as vítimas, cerceando suas liberdades, mediante cárcere privado. Durante o cárcere, os autores amarraram os pés e as mãos das vítimas, além de amordaçaram suas bocas com sacolas e fita isolante.
A vítima Elisângela foi violentamente agredida pelos autores, e teve sua mandíbula fraturada em decorrência de uma ação/golpe com objeto contundente, em que, inclusive, ocasionou a quebra de alguns dentes.
Após passarem determinado tempo mantidas em cárcere, as vítimas foram levadas para o bairro Chácaras Madelena, local onde foram executadas.
QUALIFICADORA
Durante o cárcere, a vítima Elisângela experimentou grave sofrimento físico. Isso porque foi violentamente agredida pelos autores, ocasião em que teve sua mandíbula fraturada em decorrência de uma ação/golpe com objeto contundente, provocando, inclusive, a quebra de alguns dentes.
Além do mais, tem-se que as vítimas foram submetidas a grave e intenso sofrimento moral, na medida em que foram amarradas e amordaçadas, vivenciando, além da sensação de impotência e insegurança, verdadeiros momentos de tormento e angústia.
ESTUPRO DE VULNERÁVEL
Consoante apurado, nas mesmas condições de tempo e local do Fato 2 (sequestro e cárcere privado), os denunciados MIGUEL ALVES, LEONARDO VICTOR, MARCELO AUGUSTO e Miguel Leonardo Fernandes de Almeida (falecido), agindo de forma livre, voluntária e consciente, em unidade de desígnios e comunhão de esforços, praticaram com as vítimas Camila Keila Ribeiro da Cruz e Elisângela Ribeiro da Cruz conjunção carnal e outros atos libidinosos, em circunstâncias em que elas não podiam oferecer qualquer resistência.Conforme consta, enquanto eram mantidas em cárcere privado (cativeiro), com as mãos e os pés amarrados, e a boca amordaçada – completamente indefesas –, os autores praticaram com as vítimas relações sexuais não consentidas (estupro coletivo), causando as irmãs, além da constrangedora humilhação, intenso sofrimento físico e psicológico.
Durante os trabalhos periciais, verificou-se a presença de material genético (esperma) na calcinha da vítima Elisângela.
FURTO QUALIFICADO
Consta, ainda, do inquérito policial que, logo após a ocorrência do Fato 1 (duplo homicídio qualificado), os denunciados MIGUEL ALVES, LEONARDO VICTOR, MARCELO AUGUSTO e Miguel Leonardo Fernandes de Almeida (falecido), agindo de forma livre, voluntária e consciente, mediante concurso de agentes, subtraíram, para proveito comum, coisas alheias móveis, de propriedade das vítimas Camila Keila Ribeiro da Cruz e Elisângela Ribeiro da Cruz.
Na ocasião, logo após a execução das vítimas, os autores Miguel Alves, Leonardo Victor, Marcelo Augusto e Miguel Leonardo (falecido), subtraíram, para proveito comum do grupo, os aparelhos celulares Iphone XR e Motorola Moto G5S plus, pertencentes a Camila, bem como o Samsung Galaxy A71 de propriedade de Elisângela.Além dos aparelhos celulares, os autores subtraíram também as joias que as vítimas usavam no momento dos fatos (brincos, anéis e colares de outro), e uma quantia em dinheiro que pertencia a Camila.A investigação concluiu que Miguel Alves havia ficado com o aparelho celular Iphone XR, e Marcelo Augusto com o Motorola Moto G5S plus, ambos pertencentes a Camila. Durante os trabalhos investigativos, logrou-se recuperar os mencionados dispositivos.Lado outro, não se obteve êxito em recuperar o dispositivo pertencente a Elisângela, assim como os demais objetos e valores subtraídos.
QUALIFICADORA
O crime foi praticado mediante concurso de quatro pessoas, na medida em que os autores, agindo com comunhão de esforços para proveito comum, realizaram a efetiva subtração de diversos bens das vítimas. Assim, ambos concorreram para a produção do resultado.
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA QUALIFICADA
Consta, por fim, que, em período incerto dos anos de 2023 e 2024, nesta cidade e comarca, os denunciados MIGUEL ALVES, LEONARDO VICTOR, MARCELO AUGUSTO e Miguel Leonardo Fernandes de Almeida (falecido), agindo de forma livre, voluntária e consciente, com estabilidade e permanência, associaram-se com o fim específico de cometerem crimes, notadamente aqueles considerados pela lei como hediondos ou equiparados.
Conforme apurado, os denunciados, com inequívoco animus associativo, constituíram uma sociedade ilícita, cuja finalidade precípua é a prática de atividades criminosas, sobretudo o exercício do comércio ilícito de entorpecentes nas comunidades do bairro Novo Esperança, em Ipatinga.
Durante o curso das investigações, foram deferidas medidas cautelares de extração de dados nos aparelhos telefônicos utilizados pelos denunciados. Dentre os conteúdos extraídos, destacam-se as mídias de áudio, fotográficas e audiovisuais, além das conversas de texto, via WhatsApp, revelando a robustez do vínculo associativo dos autores.
Nas imagens recuperadas, os denunciados aparecem portando drogas e armas de fogo, dentre elas, uma pistola Tauros, calibre .9mm, utilizada como instrumento do crime que vitimou Camila e Elisângela.
QUALIFICADORA
Registra-se que os denunciados se associaram para praticarem crimes, considerados pela lei como hediondos (homicídio qualificado e estupro), ou equiparados, como é o caso do tráfico de drogas, em que a punição mais rigorosa advém da própria Constituição da República (art. 5º, inciso XLIII).
Assim, tem-se que deverá incidir a qualificadora do artigo 8º da Lei 8.072/90.
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS
O fato abalou profundamente a sociedade de Ipatinga e região, sobretudo pela brutalidade dos atos praticados, em que a censurabilidade da conduta transborda as circunstâncias elementares do tipo, revelando, além do total desprezo pela vida humana, o dolo acentuado dos autores, que idealizaram e executaram crimes bárbaros, afrontando o sentimento de justiça social. Deste modo, tem-se que tal circunstância evidencia maior grau de reprovabilidade da conduta dos autores, devendo, portanto, ser valorada negativamente a título de culpabilidade intensa.
Ainda, não se pode olvidar que, ao ceifar precocemente a vida das vítimas Camila e Elisângela, os autores promoveram a destruição de uma das mais antigas e importantes instituições sociais, a família. Considerada pela Constituição da República como a base da sociedade, a família goza de especial proteção do Estado (art. 226).
Tanto Camila quanto Elisângela deixaram filhos (Emanuel Pietro Ribeiro da Silva e Samara Ribeiro de Assis), que agora se veem privados do convívio materno, e assolados pela triste lembrança do trágico e brutal fim de suas genitoras, devendo tal circunstância ser valorada negativamente a título de consequências do crime.
CAUSA DE AUMENTO DE PENA
Conforme apurado, o delito de estupro de vulnerável, narrado no Fato 3, foi praticado mediante concurso de agentes (estupro coletivo), atraindo, assim, a majorante prevista no artigo 226, inciso IV, alínea a, do Código Penal.
CONCLUSÃO
Assim agindo, os denunciados MIGUEL ALVES NASCIMENTO, LEONARDO VICTOR CITADINO DA COSTA e MARCELO AUGUSTO RODRIGUES praticaram as condutas tipificadas nos artigos. 121, 226,29 e 69, todos do Código Penal, (Lei de crimes Hediondos), e artigo 288 do Código Penal c/c art. 8º da Lei 8.072/90 (Fato 5), motivo pelo qual REQUER o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, após o recebimento desta, sejam os denunciados citados para apresentarem suas defesas no prazo legal.
Após, REQUER a inquirição das testemunhas abaixo arroladas, bem como o interrogatório dos denunciados para, ao final, seguidas as demais formalidades da lei, sejam eles PRONUNCIADOS de acordo com a imputação acima, conforme o rito relativo aos crimes dolosos contra a vida, nos termos do artigo 406 e seguintes do Código de Processo Penal, e, ao final, serem submetidos a julgamento perante o Tribunal do Júri.
Em seguida, requer sejam os denunciados CONDENADOS a cumprir as penas cabíveis, assim como a reparar aos familiares das vítimas os danos materiais e morais causados pela prática delitiva, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal.
REQUER, por fim, a anotação da prioridade legal, prevista para a apuração dos crimes hediondos, nos termos do artigo 394-A, do Código de Processo Penal.
Ipatinga/MG, 7 de março de 2024
Igor Citeli Fajardo Castro
Promotor de Justiça